5 de setembro: Um marco da religiosidade católica de Lagarto

5 de setembro de 2017 - 13:54, por Claudefranklin Monteiro

Por Dr. Claudefranklin Monteiro

Reza a lenda, ainda carente de comprovação histórica, porém marcada com o fervor criativo da gente do Lagarto, que a imagem de madeira de Nossa Senhora da Piedade, em tamanho natural (uma obra-prima da escultura portuguesa do século XVII), que hoje repousa no altar-mor da Matriz que leva seu nome, deveria ter ido para Salvador e uma réplica, em tamanho menor, ter ficado na vila. Porém, um acidente no deslocamento das mesmas para seus destinos teria provocado uma atrapalhação e então, a troca. Mais tarde, o Arcebispado da Bahia tentou desfazer o ocorrido, mas já era tarde: a imagem já havia passado pelo processo ritualístico de entronização. Conta-se, inclusive que o nicho preparado para uma imagem da santa ficou apertado, pois se imaginava que viria a outra.

Acervo da Paróquia Nossa Senhora da Piedade/Lagarto-SE

Acervo da Paróquia Nossa Senhora da Piedade/Lagarto-SE

Consultando o acervo do Arquivo dos Capuchinhos do Convento de Nossa Senhora da Piedade, em Salvador-BA, detectamos elementos que podem levar a essa troca casual a ser mais um dos equívocos registrados em torno da formação religiosa da Vila de Nossa Senhora da Piedade. A controversa instalação e presença dos Capuchinhos em Salvador podem ajudar-nos a desvendar esse enigma em torno da chegada imagem a Lagarto. No contexto histórico de sua entronização, 05 de setembro de 1679, o local da futura Igreja e Convento da Piedade em Salvador estava passando por um processo litigioso dentro da Ordem. Os primeiros religiosos a chegarem à primeira capital do Brasil foram franceses, em 1642. Segundo Pietro Vitorino Regni, eles aportaram nas terras brasileiras de forma inusitada, à época do domínio holandês. Vindos da Província Bretanha, na Ilha de São Tomé, Costa da África, foram capturados três religiosos e depois presos em Angola: Frei Colombino de Nantes, Frei Jorge de Combourg e Frei Bonício de Quinper. Pouco tempo depois, foram parar em Recife. Proibidos de professarem o culto católico no lugar, mudaram-se para Olinda, onde, por ordem do Conde Maurício de Nassau, construíram uma capela (REGNI, 1988, pp. 47-48).

Livro lançado em outubro de 2016

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Anos depois, 1679, da chegada dos religiosos italianos a Salvador, os franceses haviam recebido da Coroa Portuguesa alvará para a construção dos referidos espaços que seriam dedicados à Nossa Senhora da Piedade. A pendenga entre os capuchinhos franceses e italianos se arrastaria até 1702, quando o Rei de Portugal revogou a decisão anterior, permitindo a estes últimos a administrarem o lugar. Ao longo dos anos que se seguiram, eles sofreram, ainda, toda ordem de ingerência, a exemplo dos Beneditinos (HOLLANDA, 2008. pp. 107-108).

Desse modo, fica evidenciado que não há nada em comum entre a entronização de Nossa Senhora da Piedade na Vila do Lagarto e a presença dessa devoção em Salvador. Isto nos leva a crer que a imagem que repousa há mais de trezentos anos na Matriz lagartense tenha sido uma doação de Portugal, sem a interferência dos Capuchinhos franceses, sequer dos italianos. Além disso, é importante ressaltar que em Sergipe, aquela Ordem atuou embrionariamente em lugares como a Ilha de São Pedro, Porto da Folha e Pacatuba. A presença capuchinha em Lagarto é muito posterior ao presente cenário e pode ser notada a partir da segunda metade do século XIX, em Santas

Missões ocorridas, inclusive, nas administrações dos padres Daltro, Vicente Francisco e Geminiano.

Frei Eliseu Bandeira, administrador do Arquivo dos Capuchinhos do Covento de Nossa Senhora da Piedade, em Salvador-BA, chamou-nos a atenção para um detalhe bem curioso que só descarta, ainda mais, a possibilidade de as imagens terem sido trocadas. Frei Geraldino de Santa Rita Loiola, que encomendou a imagem de Lagarto a Portugal não era capuchinho e sim, carmelita. Os carmelitas, em geral, ao contrário dos capuchinhos, usam sobrenomes de santos, enquanto estes adotam seus lugares de origem. Portanto, mais uma vez se configura a presença determinante da Ordem Carmelita na formação da vida religiosa da Vila de Nossa Senhora da Piedade do Lagarto.

Em 1974, por ocasião de um processo de restauração que a imagem precisou passar, o Diretor do Museu de Arte Sacra da Bahia, o Sr. Valetim Calderón, afirmou que não havia a menor possibilidade de ter ocorrido a troca dos artefatos como se convencionou acreditar pelo imaginário popular lagartense. Segundo ele, um dos maiores argumentos daquele equívoco é o estilo das duas esculturas. Uma é clássica e a outra, barroca (Jornal “A Tarde”. Salvador-BA, 04 de junho de 1974. Capa).

O fato é que, ao longo dos anos, Nossa Senhora da Piedade tornou-se a excelsa protetora do povo lagartense, que por sua vez passou a lhe render homenagens ao longo dos séculos, a exemplo da Coroação Canônica de sua imagem tricentenária, ocorrido por determinação do Papa Paulo VI, em 1979, ocasião em que se realizava em Lagarto o Congresso Eucarístico e as comemorações dos trezentos anos de criação da paróquia.

Certamente, o momento mais marcante dessa secular devoção é o Novenário dedicado a sua memória durante a primeira semana de setembro, cujo desfecho é, curiosamente, o dia dedicado à natividade da Virgem Maria: 08 de setembro. Preparada com muito esmero, a Festa da Padroeira se transformou ao longo da História de Lagarto na mais entusiasmada manifestação religiosa de sua gente ao lado da devoção à São Benedito, esta última, pelo menos até a primeira metade do século XX.

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