A MAIZENA

9 de junho de 2020 - 11:28, por Claudefranklin Monteiro

Recebi por esses dias, em meu celular, um vídeo grotesco de um sujeito vociferando coisas sem pé e sem cabeça. Sem lógica, sem sal e sem pimenta. A cena chamou atenção não pelo conteúdo, mas pela alegoria. Em meio a uma revoada de gestos desconexos e palavras vis, uma caixa de Maizena se destacava na bancada do ruminante.

O visual da Maizena (amarelo) é inconfundível e sempre frequentou meu imaginário e minhas memórias. Logo, a sua imagem remete a minha saudosa mãe, de avental sobre a cintura, a fazer deliciosos bolos de ovos, que depois de prontos além de virarem uma obra de arte, faziam a festa de meu paladar.

E por falar em festa, necessariamente de folia, a iguaria (marca de amido de milho criada em 1842, nos EUA) fazia parte do “arsenal de guerra” dos carnavais de rua, inclusive dos nossos, os lagartenses, que efusivamente e “sujos” acompanhavam a música que vinha do caminhão de luz, o trio elétrico.

O historiador Haroldo Costa, em seu livro Política e Religiões no Carnaval (2007), faz um valioso balanço do carnaval na história e sua chegada ao Brasil, notadamente com a Família Real, em 1808 (primeiro na Bahia e depois no Rio de Janeiro, onde se instalou). Costa ressalta que o mela-mela está na essência da folia momesca brasileira e foi regularizada com o tempo pelos tumultos que vez ou outra provocava.

Se em Lagarto a tradição acabou, como muitas tantas e outras ainda em risco de desaparecimento, em outros lugares do Brasil, o uso da Maizena entre os brincantes de carnaval ainda é muito comum. Nas cidades de Imperatriz e Madre de Deus, no Maranhão, em meio a confetes e serpentinas, a famosa marca de amido de milho segue reinando nas ruas. Em Caxias, também no Maranhão, tem até Bloco da Maizena.

Em reportagem sobre o assunto, um folião da cidade de Imperatriz assim se expressou: “Carnaval sem sujar os outros, não presta, não tem emoção” (Edilson Ramos, 2017). Para muitos, também é momento de extravasar, por para fora o que lhe incomoda por dentro, que na maioria das vezes corrói a alma, como sentimentos ruins de inveja, ressentimento, falta de altivez, negacionismo, anulação de si próprio e falta de decência e de empatia.

O uso da Maizena, nesse sentido, é causa de subversão, como é subvertido, naturalmente, o carnaval, sem lhe castrar a sua essência: a alegria. O amido de milho também provoca um efeito interessante na folia: ele neblina o ambiente e até mesmo as consciências. A visão turva não permite encarar a realidade e a vida dá espaço à fantasia, ao embuste e ao enfeite, que torna bonito o que é feio por natureza: por dentro e por fora.

E já que o assunto é estética, também, não poderia deixar de encerrar essa crônica destacando outra propriedade da Maizena. A sua capacidade de alisar os cabelos. Quem dera a Maizena também tivesse efeito para a língua. Se assim o fosse, seríamos poupados de ver a iguaria de amido de milho ser profanada e desperdiçada (em tempos de fome causada pela pandemia) no cenário de um arremedo de historicismo ao melhor estilo papagaio de pirata.

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