CONTE SUA HISTÓRIA, RAYMUNDA DA MÃE RAINHA

29 de dezembro de 2021 - 08:55, por Claudefranklin Monteiro

Quando a vi pela primeira vez, imaginei que fosse uma freira. E fiquei pensando que fosse por muito tempo até meu irmão e padrinho Cláudio Monteiro me dizer que se tratava de Raymunda de Anália. Embora eu ouvisse, também, as pessoas a chamarem de Raymunda da Telergipe ou mesmo de Ray, segundo ela seu nome de guerra. Na oportunidade que tive de servir com ela na condição de Ministro Extraordinário da Sagrada Comunhão, ela já se chamava de Raymunda da Mãe Rainha. Foi quando me dei conta que aqueles outros codinomes se tratavam da mesma pessoa: disponível, prestativa, devota e criativa. Aquela mesma senhora que frequentava a casa da avó materna de minha esposa e a chamava de Mãe Zefinha.

No dia 17 de outubro de 2021, em sua residência, ela me concedeu uma entrevista. Com óculos escuro, em razão de uma cirurgia, sentada em sua cama, solícita e disposta a me falar sobre os tempos em que esteve à frente do Movimento da Mãe Rainha, em Lagarto, e também da sua trajetória. Acompanhada de sua dedicada afilhada, Alzira, parecia muito contente com a minha visita e não mediu esforços para puxar da memória inúmeros fatos, inclusive da vida religiosa da Paróquia Nossa Senhora da Piedade, de cuja história esteve sempre à frente, colocando seus dons a serviço.

Josepha Raymunda Santos nasceu no dia 28 de outubro de 1937, na antiga rua da Jaqueira, em Lagarto-SE. Seus pais, Mário José dos Santos e Maria Anália Santos, em tenra idade já a estimulava para as artes, eles percebiam que a menina tinha muito talento. Com dona Maria Teles Cerqueira recebeu as primeiras instruções escolares e com ela fez a Primeira Comunhão, vestida de anjo, sob as bênçãos de monsenhor Marinho. Aos 9 anos, matriculou-se no Colégio Nossa Senhora da Piedade. Foi a terceira aluna a ser matriculada na implantação daquela instituição em 1947. Ali, fez toda a sua formação, inclusive o Pedagógico.

Com as irmãs do Colégio Nossa Senhora da Piedade, desde menina, sempre teve uma especial amizade, a ponto de alguns dias pernoitar na instituição. Mariana desde muito nova, entregava seu destino à Mãe Santíssima e esperava que ela a guiasse em seus projetos, se professora ou mesmo religiosa. E nessa convivência diária, nasceu o desejo dela de se doar à vida franciscana de convento. É fato, revelou-me, que também chegou a fazer planos de se casar e até teve um namorado, alguém do povoado Pé da Serra do Qui de quem não lembra o nome.

Já noiva e de compromisso firmado, com dezessete anos, abriu seu coração para os pais e revelou-os o desejo de ser religiosa consagrada. Com a ajuda da irmã Edite, fez todos os preparativos para ir para o convento. Chegou, assim, a ser noviça e mesmo a professar, na cidade de Penedo-AL. Ali, ele aprendeu a ter uma rotina disciplinar, com orações e estudos. Ela, inicialmente, teria que se responsabilizar por uma turma infantil, no Colégio das Irmãs Franciscanas Hospitaleiras da Imaculada da Conceição, mas não se adaptou. Assim, passou a ensinar uma turma noturna, lecionando geografia, desenho artístico e linear. Em Maceió, ela e a professora Darticlea, conterrânea de Lagarto, fizeram a Licenciatura Curta. Uma em Geografia e a outra em História. Afora isso, fez inúmeros cursos, incluindo pintura em tela, em Salvador.

Raymunda nos tempos de noviça
(Acervo pessoal)

Segundo Raymunda, a morte do pai, que vivia como vendedor ambulante, pesou muito na decisão de deixar o convento. A mãe, dona de casa e de saúde frágil, precisava de seus cuidados. A decisão não foi imediata. Assim, ela precisou de um tempo para ponderar e pensar bem, retornando a Lagarto. Chegou a deixar os seus pertences no convento por mais de um ano. Na ocasião, o Colégio Nossa Senhora da Piedade estava comemorando seus 25 anos. Era o ano de 1972. A essa altura, Raymunda já tinha desenvolvido grande habilidade em decoração, feitura de cartazes e outras coisas do tipo e se empenhou por inteira no evento, mobilizando um grande número de pessoas e contando com o apoio e a amizade de monsenhor Juarez Prata.

Aquele momento foi importante para ela: “(…) Foi o que me levantou. Foi uma higiene mental que eu fiz. Eu estava impaciente, porque ainda estava em casa. Então, eu resolvi a ficar com minha mãe”. Ela era a única filha mulher. Seus irmãos, Rinaldo e Reginaldo já tinha se arranjado na vida. O serviço prestado às comemorações do Colégio Nossa Senhora da Piedade lhe abriu as portas para a vida profissional, sobretudo nessa parte de cerimonial e organização e decoração de festas.

Com o apoio de Dr. João Rocha, tornou-se professora do Colégio Estadual Sílvio Romero e também no Colégio Laudelino Freire. Também por intermédio daquele líder político e ex-prefeito de Lagarto, Raymunda foi convidada para trabalhar na antiga Telergipe, empresa de telefonia fixa. Com a nova missão, já aposentada como professora, passou a se dedicar exclusivamente à instituição, cuja sede era na Praça Filomeno Hora. Ali, foi de tudo um pouco. Era tudo muito embrionário: “Na Telergipe, cheguei até a subir em poste. Naquela época, só havia linhas interurbanas. E quando dava defeito, eu chamava o pessoal de Aracaju, que demorava muito para chegar. Com ajuda de seu Hercílio, eu me preparava toda, ele colocava uma escada pra mim, eu subia e consertava”, disse-me rindo ao lembrar da cena. Disse que foi uma época muito boa. Fez muito amigos e tinha o respeito e carinho dos superiores de Lagarto, a exemplo de seu Arnaldo, chegando a ser homenageada. Em sua aposentadoria, lhe fizeram uma festa num ginásio de esporte.

Em meio a vida como professora e às voltas com as demandas da Telergipe, seguia dando auxílio ao Colégio Nossa Senhora da Piedade e à Paróquia Nossa Senhora da Piedade. Foi assim na chegada dos padres Mário e Danilo, da Itália, no Congresso Eucarístico, em 1979 e em todos os momentos religiosos da cidade. Em 1982, monsenhor Mário Rino Sivieri lhe conferiu uma importante missão: fundar a Legião de Maria em Lagarto, com a ajuda da Irmã Nazaré Sacramentina. Nasceu com quatro pessoas.

Outro grande empreendimento religioso em que Raymunda se envolveu e até mesmo com quem se confunde até hoje foi a implantação do Movimento Mãe Rainha em Lagarto. Em parceria com a irmã Coração, do Colégio São José do Patrocínio, em Aracaju, tomou todas as providências.

“Por obra e graça de Nossa Senhora e por inspiração da irmã Coração, franciscana do Colégio São José do Patrocínio, numa tarde do dia 7 de outubro de 1993, em nossa residência na avenida Leandro Maciel, era implantado em Lagarto, na Paróquia Nossa Senhora da Piedade, o Movimento da Mãe Rainha, contando com o apoio incondicional do então Monsenhor Mário Rino Sivieri (de saudosa memória). Éramos poucas e depois de alguns meses conseguimos alcançar o número de 30 para implementarmos nossas principais ações pastorais, todas elas sempre marcadas com grande fervor e entusiasmo, a exemplo da Procissão Luminosa todo dia 18 do mês” (Raymunda, Lagarto-SE, 18 de outubro de 2021 – agradecimento lido em missa no Santuário Nossa Senhora da Piedade).

Evento da Mãe Rainha – Raymunda ao centro, com Conceição a sua direita e Janete a sua esquerda
(Acervo pessoal)

No dia 18 de outubro de 2021, após 28 anos de dedicação, ela passou a liderança do Movimento da Mãe Rainha em Lagarto para a senhora Meirinha. Em entrevista, Raymunda me disse que dois foram os momentos mais marcantes dessa linda história: a comemoração dos 15 anos, em 2008, e implantação do movimento no povoado Horta, hoje território da Paróquia Santa Teresinha do Menino Jesus. Quanto a isto, sente-se muito agradecida à Normélia e seu Enoque da Farinha, doador do terreno onde hoje está em processo de acabamento uma belíssima igreja, com uma comunidade bastante engajada.

Sob a proteção de sua madrinha de batismo, Nossa Senhora do Bom Parto, Raymunda já não tem mais aquela saúde e disposição de outros tempos, naturalmente. Com 84 anos, vive hoje em sua casa, com seu irmão Rinaldo, sempre as voltas com amigos e familiares. Na entrevista, me confidenciou que não tendo sido religiosa, como desejara, fez questão de se consagrar como secular, pela mesma congregação, na igreja São Judas Tadeu, em Aracaju, com frei Cristóvão de Santo Hilário, nos anos 60: “Recebi a licença da comunidade, o que se chama de exclaustração. E segui recebendo inúmeras correspondências do Convento”. Sua casa, passou a ser uma espécie de porto seguro para as religiosas e para sacerdotes que vinham de várias partes do Brasil e do mundo.

Ao longo desses anos, no âmbito clerical, fez inúmeras amizades, além das aqui citadas. Entre elas, destaca duas em especial: a irmã Belmira e o padre Raymundo Diniz. A primeira, alguém muito especial e próxima, a ponto de aguardar a sua presença para enfim falecer, após um período doloroso de convalescência. O outro, um amigo, um confidente, até mesmo um irmão, com quem mantém contato até hoje, carinho que foi consolidado quando de sua passagem como pároco por Lagarto.

Raymunda com a Irmã Belmira Brandão , em seu leito de morte.
(Acervo pessoal)

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